RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A defesa de Wilson Witzel (PSC) apontou o que considera contradições em denúncias apresentadas à Justiça e envolveu um ex-subsecretário para tentar impedir a abertura do processo de impeachment contra o governador afastado do Rio de Janeiro. O documento apresentado pelos advogados de Witzel nesta segunda-feira (19) ao Tribunal Especial Misto busca desvincular o empresário Mário Peixoto, preso em desdobramento da Lava Jato, da organização social que o governador beneficiou com uma decisão. O objetivo é descaracterizar o único ato de ofício apontado na denúncia do MPF (Ministério Público Federal) e reproduzido no pedido de afastamento em análise no tribunal formado por deputados estaduais e desembargadores. Witzel foi afastado por 180 dias do cargo pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) em agosto, durante a deflagração da Operação Tris in Idem. Em paralelo, o impeachment do governador foi aprovado na Assembleia Legislativa, mas ainda precisa ser submetido ao Tribunal Especial Misto para que o processo seja instaurado e seu afastamento, por essa via, também se concretize. O governador afastado aposta suas fichas na defesa perante o Tribunal Misto, composto por cinco deputados e cinco desembargadores. Caso consiga convencer o colegiado a recusar a denúncia, Witzel considera que o STJ será pressionado a alterar sua decisão de afastamento. O relator do processo no tribunal, o deputado Waldeck Carneiro (PT), tem dez dias para elaborar seu relatório sobre o caso. Após a apresentação do documento, o colegiado tem dois dias para decidir sobre a instauração do processo. Caso ele seja aberto, inicia-se uma nova ordem de afastamento até o julgamento, que tem prazo de 180 dias para ocorrer. A principal estratégia dos advogados de Witzel foi aderir à tese de defesa do empresário Mário Peixoto, acusado de pagar propina ao governador afastado por meio de escritório de advocacia da ex-primeira-dama Helena Witzel. Eles afirmam não ser possível vincular Peixoto à organização social Unir Saúde, beneficiada por um ato do governador afastado que a requalificou para assinar contratos com o estado após uma série de punições. Peixoto não figura entre os representantes da entidade, mas é apontado como sócio oculto dela pelo Ministério Público Federal. A Procuradoria vincula o ato do governador ao pagamento de R$ 274 mil feito à firma de Helena por três empresas em nome de supostos operadores financeiros de Peixoto. A defesa do governador afastado usa uma denúncia do Ministério Público fluminense sobre fraudes cometidas pela mesma organização social na qual o empresário não é acusado. Nela, a Promotoria aponta Luiz Roberto Martins como chefe da organização criminosa. Enquanto para o MP-RJ Martins é o chefe da organização criminosa -sendo também um sócio oculto da organização social-, para o MPF ele é apenas um dos membros do núcleo administrativo do grupo de Peixoto. As duas investigações correram em paralelo, e contaram com interceptações telefônicas em períodos distintos. A fase ostensiva de ambas, para cumprimento de mandados de prisões e busca e apreensão, ocorreu no mesmo dia numa ação conjunta. A principal prova apontada pelo MPF de vínculo entre Peixoto e a Unir Saúde é uma gravação telefônica autorizada pela Justiça na qual Martins afirma a um interlocutor, em março deste ano: “Diz o Mário que foi ele que acertou junto com o governador”. Para o MPF, o Mário a que Martins se refere é Mário Peixoto. O vínculo entre o empresário e a Unir Saúde foi mencionado pelo ex-secretário de Saúde Edmar Santos, que se tornou delator. Ele afirma que se reuniu com o empresário a pedido do ex-secretário Lucas Tristão, preso na operação, para tratar da punição imposta à organização social. Segundo Santos, Witzel lhe disse que iria requalificar a entidade “porque teria que atender a um pedido”. O delator afirma que, “em função do histórico”, imaginou se tratar de um pedido de Peixoto. A defesa de Witzel afirma que o nome citado pode ser uma referência a Mário Marques, ex-subsecretário de Comunicação Social do estado. Os advogados de Witzel não afirmam que ele tratou da desqualificação da OS com Marques, mas dizem que o ex-subsecretário é filho do ex-vice-prefeito de Nelson Bornier, ex-prefeito de Nova Iguaçu e pai de um secretário na gestão Witzel. Em outra gravação, Martins agradece a Bornier e atribui a ele “uma parte da paternidade” pela requalificação. Os advogados dizem ainda que o governador afastado e sua esposa não tinham como saber do vínculo entre as empresas que a contrataram e Peixoto, como descrito pelo MPF. “O casal Witzel era outsider, não estava familiarizado ao contaminado ambiente político/empresarial deste estado. Sua visão não passava dos limites expressos nos contratos que assinaram. Nada além”, diz a defesa. O processo de impeachment também trata de supostas fraudes na contratação da organização social Iabas para a gestão de hospital de campanha para atendimento de vítimas da pandemia de Covid-19. Em sua defesa, ele afirma que não há provas de interferência sua nos processos administrativos da Secretaria de Saúde. Os advogados de Witzel também abordam na defesa uma acusação do MPF que não faz parte do processo em análise para o impeachment. Trata-se do pagamento de R$ 280 mil feito pelo Hospital Jardim Amália, de propriedade de Gothardo Lopes Neto, dono de outras empresas com contratos com o estado. Eles afirmam que Helena já prestou serviços em favor do hospital ao menos desde 2017, indicando documentos que comprovam a atuação. Procurado, Mário Marques nega ter tratado do tema com o governador afastado e disse considerar lamentável a tese da defesa. “Meu trabalho é absolutamente técnico, e eu não tenho absolutamente nenhuma relação com Nelson Bornier. E o filho do Bornier, o Felipe Bornier, era secretário de Esportes do governo Witzel. Então seria mais factível essa ligação com o governador em vez de mim. Eu tinha alguns dias no governo quando isso aconteceu”, disse Marques. Em nota, Witzel afirmou que nunca tratou da requalificação da organização social com o ex-subsecretário.