SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Com o cessar-fogo mediado pelo Kremlin entre Armênia e Azerbaijão falhando diariamente, a Rússia decidiu buscar o caminho da intimidação militar para tentar forçar uma estabilização do conflito no Cáucaso. A Flotilha do Mar Cáspio enviou nesta sexta (16) seis navios de guerra, sete aeronaves militares e mobilizou 400 soldados para um exercício naval ao norte da península de Absheron, onde fica a capital azeri, Baku. O Azerbaijão não tem meios de dissuadir um eventual bloqueio russo contra suas forças, e o subsolo do mar Cáspio é a fonte da maior parte de seus recursos em gás natural e petróleo. O recado, não exatamente sutil, também foi dado a Ierevan. O Distrito Militar Meridional da Rússia fez um exercício conjunto com as forças da república separatista da Abkhásia, um território russo étnico autônomo na Geórgia – a algumas centenas de quilômetros da fronteira armênia. Foram mobilizados 1.500 homens para simular defesa costeira no mar Negro, com o uso de tanques e blindados. Quando houve uma escaramuça inicial do atual conflito entre azeris e armênios na região disputada de Nagorno-Karabakh, em julho deste ano, os russos fizeram uma megabolização de 150 mil homens na região do Cáucaso. Naquele momento, pareceu dar certo e as tensões baixaram. Mas o Azerbaijão foi incentivado pela Turquia, tanto politicamente como com um aumento grande de recebimento de material militar, a se reforçar para a tentativa de retomada do controle da região. Objeto de uma guerra de 1992 a 1994, Nagorno-Karabakh é um encrave de maioria armênia no Azerbaijão, deixado lá na divisão do butim do Cáucaso pela União Soviética nos anos 1920, como forma de esvaziar nacionalismos e agradar os turcos –antigos adversários pela influência na região e com laços culturais com os azeris. Ao fim do conflito, resultante de um cessar-fogo, os armênios não só retiveram a área governada pelos locais como ocuparam militarmente um cinturão de sete distritos em torno de Nagorno-Karabakh, ajudando assim a defesa do território e o conectando ao país. Em 27 de setembro, o que Baku chamou de defesa contra um ataque resultou em uma grande operação militar que observadores independentes consideraram uma ofensiva planejada. Não houve ganhos territoriais significativos até aqui, mas a violência é a maior desde a guerra nos ano 1990, com mais de 600 mortos oficiais, a maioria militar, um número inferior à realidade porque Baku não revela suas baixas fardadas. No sábado passado (10), a Rússia intermediou um cessar-fogo, com apoio dos parceiros EUA e Rússia do grupo que busca solucionar o conflito desde 1992. Não está funcionando, apesar da pressão de Moscou. Há bombardeios de áreas civis dos dois lados, e o risco de uma escalada regional porque os azeris já atingiram lançadores de mísseis do inimigo dentro do territorio armênio. O cenário mais sombrio vê a Rússia, que tem um acordo militar com a Armênia para manter uma base no país, retaliando contra Baku – o que poderia trazer os turcos, membros da Otan (aliança militar ocidental) para a briga. Mas essa é a hipótese mais extrema. Como se viu nesta sexta, Moscou está disposta a admoestar os dois lados, até porque antevê um aumento de influência sobre um Azerbaijão rico em hidrocarbonetos e aliado de sua rival regional Turquia caso alguma paz seja encontrada. Se terá sucesso, é outra questão. Mas estrategicamente o governo de Vladimir Putin não pode permitir que a instabilidade do sul do Cáucaso, uma das rotas de invasão contra si possíveis, contamine o norte da região, que está sob seu controle. Em solo, os combates continuaram ao longo desta sexta. Baku disse ter “liberado” oito vilarejos nas áreas ocupadas pelos armênios, mas o fato é que são territórios largamente vazios. Talvez 500 mil pessoas deixaram a área depois da guerra.