SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Iniciativas governamentais buscam descentralizar o segmento de startups brasileiro, hoje concentrado em São Paulo. Das cerca de 13 mil empresas em atividade, pelo menos um terço está localizada no estado, que também reúne o maior volume de investimentos no setor (US$ 1,161 bilhão neste ano), segundo a Associação Brasileira de Startups (ABStartups). A título de comparação, o segundo lugar no ranking de investimentos é o Rio de Janeiro, que apesar da colocação, somou apenas US$ 77,5 milhões em aportes no mesmo período. O primeiro estado nordestino que aparece no ranking da ABStartups é a Bahia, com apenas dois investimentos, somando US$ 11,7 milhões. Ceará e Pernambuco aparecem, respectivamente, em quinto e décimo lugares, com aportes de US$ 2,5 milhões e US$ 900 mil. Para mudar esse perfil, o Ministério da Economia mantém, dentro da Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade (Sepec/ME), dois programas que fazem parte do projeto Brasil 4.0: o InovAtiva Brasil e o StartOut Brasil. Criado em 2013, ainda dentro do extinto Ministério de Indústria, Comércio, e Comércio Exterior, o InovAtiva se tornou, em 2019, segundo o subsecretário Igor Nazareth, “o maior programa de aceleração de startups da América Latina”. Com um orçamento inicial previsto de R$ 3,780 milhões, o programa recebeu um aporte extra no ano passado, elevando o orçamento para R$ 4,880 milhões no triênio. De acordo com Nazareth, foram mais de 2.200 startups aceleradas. A meta é acelerar 15 mil nos próximos quatro anos. “O InovAtiva é um programa online, gratuito e em larga escala. Tentamos chegar em localidades em que não há nenhum programa, conteúdo, ou mentoria, e levamos tudo isso para todas as regiões do país, complementando o que já existe e conectando as pontas dos atores privados”, diz. Neste ano, o programa passou a chamar-se InovAtiva Hub. “Nosso objetivo é deixar de ser só um programa de aceleração e passar a ser um grande hub de startups, com ações também de internacionalização, conexão com grandes empresas”, diz Nazareth. Está em andamento um processo de Chamamento Público que vai selecionar a instituição que executará o novo modelo para os próximos quatro anos. O Termo de Colaboração para a execução terá valor total de R$ 20 milhões, segundo o Ministério da Economia. O StartOut Brasil, desenvolvido em parceria com Apex, Sebrae, Anprotec e Ministério de Relações Exteriores, visa a internacionalização das startups já estabelecidas, com faturamento acima dos R$ 500 mil, ou que já tenham recebido algum tipo de investimento. O programa prepara os empreendedores para a entrada em novos mercados, como Miami, Paris, Berlim e Lisboa. “Em um dos últimos ciclos, tivemos 60% de sucesso com resultados altamente positivos, com as startups instalando-se naquele país, recebendo investimentos ou fechando acordo com parceiros”, diz Nazareth. Entre as startups que já participaram dos dois programas está a Aya Tech, empresa de nanotecnologia criada por Fernanda Checchinato para desenvolver biorrepelentes, sprays bactericidas e fungicidas e antissépticos sem álcool. Engenheira química que um dia se viu considerada superqualificada para o mercado de trabalho, ela desenvolveu suas linhas com capital próprio e uma pequena ajuda da família. Em 2017, conheceu o programa StartOut Brasil, de olho no mercado exterior. Foi selecionada e participou do ciclo Paris do programa, onde descobriu o InovAtiva. “Fiz o caminho contrário, em geral as pessoas começam pelo InovAtiva, mas nós fomos direto ao StartOut”, conta ela. “Passamos por todos os programas de aceleração deles, aprendemos como participar de um pitch, como falar com o investidor, com os órgãos governamentais e reguladores, e vimos que fica muito mais fácil você chegar em outro país com o governo apresentando sua empresa do que ir por conta própria”. Outra startup que se beneficiou do programa do governo foi a Telavita, plataforma que oferece atendimento em telepsicologia e telepsiquiatria. “Neste momento da pandemia, conseguimos crescer 10 vezes ante 2019”, conta Andy Bookas, um dos cofundadores da empresa, que participou do InovAtiva em 2019. “Além de ser gratuito, ao contrário de muitos programas de aceleraçã o, o InovAtiva nos permitiu um direcionamento e uma mentoria que agregaram muito valor para nos ajudar a avançar e resolver problemas que tínhamos na época e que nos ajudaram a preparar a Telavita para esse crescimento da demanda”, acrescenta. O subsecretário explica que a proposta dos programas não é concorrer com as aceleradoras da iniciativa privada nem com investidores. A secretaria também tem trabalhado no desenho de um marco legal para o setor no Brasil, que deve ser enviado nas próximas semanas ao Congresso Nacional. Esse projeto, que começou a ser construído no ano passado pelo Ministério da Economia e o de Ciência, Tecnologia e Inovação, envolveu tanto representantes do setor privado como de instituições públicas, a partir de uma audiência pública realizada no ano passado. Entre as mudanças propostas pelo marco, segundo Nazareth, estão a redução da burocracia para as startups, o aumento da oferta de investimento e da segurança jurídica e a definição das regras para compras públicas. “Já existe uma comissão no Congresso com um projeto ao qual nosso material será apensado, para a construção de um projeto único”, diz. Já para Tiago Ávila, head do Distrito Dataminer, entidade que realiza pesquisas sobre o setor, a iniciativa exige cautela. “A regulação no Brasil tem que ser vista com muito cuidado, porque o segmento de startups já é muito prejudicado por uma barreira tributária muito grande, muita burocracia, e é isso que tem que ser simplificado”, afirma.