STF manda Ministério da Justiça suspender produção de relatórios do governo contra opositores

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O STF (Supremo Tribunal Federal) determinou, nesta quinta-feira (20), que o Ministério da Justiça suspenda a produção de relatórios contra integrantes do movimento antifascista ou contra qualquer outro opositor político que aja dentro da lei. Os ministros fizeram críticas ao levantamento sobre o comportamento de policiais e professores elaborado pela pasta do governo Jair Bolsonaro e proibiram o monitoramento de situações baseado em “escolhas pessoais e políticas” de cidadãos. O julgamento foi retomado nesta quinta com o voto do ministro Alexandre de Moraes. Além dele, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Dias Toffoli também acompanharam a relatora, Cármen Lúcia. O ministro Marco Aurélio foi o único a divergir e defender a rejeição da ação apresentada pela Rede. A existência do relatório foi revelada pelo UOL em 24 de julho. A cargo do Ministério da Justiça, o levantamento mirou 579 policiais e professores de todo o país autodenominados antifascistas. Moraes disse que o relatório é precário e mais parece um “clipping jornalístico”, mas ponderou que houve desvio de finalidade no trabalho do ministério. “Está mais pra fofocaiada do que para relatório de inteligência, mas podia avançar no sentido mais profissional e mais perigoso”, disse. Para Moraes, o fato mais preocupante é o “viés político” do material. “O que mais me parece desvio de finalidade é a tentativa de órgãos de inteligência de tentar planilhar as preferências políticas e filosóficas de agentes policiais sem que eles tivessem praticado qualquer atividade ilícita”, ressaltou. Moraes, que foi ministro da Justiça durante os Jogos Olímpicos de 2016, disse que a pasta nunca produziu material similar a esse na sua gestão. “Não se bisbilhotava se policial militar do Amapá ia torcer para Rússia ou pra China no jogo de vôlei, isso pouco importava para efeito de saber se era comunista, socialista ou capitalista. O que se trocavam eram fatos, informações.” Fachin e Barroso ressaltaram que o relatório foi feito em abril e tentaram eximir de culpa o atual ministro da Justiça, André Mendonça, uma vez que o chefe da pasta na época era Sergio Moro. “Mendonça não teve ligação com evento porque os fatos são anteriores à sua própria designação ao cargo”, disse Barroso. O ministro afirmou que o material é “completamente incompatível com a democracia” e só poderia ser feito se houvesse algum elemento para supor que os integrantes do movimento estavam agindo contra o Estado ou contra as instituições democráticas. “Se as preocupações fossem verdadeiramente essas, talvez fosse caso de monitorar grupos fascistas, e não os grupos antifascistas”, disse. Barroso ainda lembrou atos do regime militar e disse que o passado do Brasil “condena” o uso indevido de órgãos de segurança. Rosa Weber, por sua vez, rechaçou que a decisão do Supremo vise “imputar de ilícita a atividade de inteligência por si mesma”. No entanto, ela disse considerar imprescindível que haja a vinculação entre o relatório e um fato relevante para a segurança da sociedade. “Relatórios de inteligência não podem ter como alvo uma ideologia específica, ou sua ameaça, independentemente da ideologia que expressa”, disse. Já Fux usou o trabalho de Moraes quando integrou o Executivo federal para ser seguido como exemplo para o atual governo. “Comparar processo de inteligência capitaneado pelo ministro Alexandre de Moraes torna esse documento absolutamente inócuo. O que se contém no documento são fatos impassíveis de ser objeto de relatório de inteligência. Dever-se-ia denominar relatório de desinteligência. Para que não serve serviço de inteligência? Exatamente para os fins mencionados”, criticou. O ministro disse que a atuação irregular do governo nessa área pode impactar até na economia. “A defesa da liberdade de expressão também é muito importante na atração dos investidores estrangeiros. Os reflexos internacionais, quando se insinua esses relatórios que podem voltar nossa memória a um período bastante nebuloso, tem reflexos internacionais”, frisou. O voto de Cármen Lúcia foi para “suspender todo e qualquer ato do Ministério da Justiça e Segurança Pública de produção ou compartilhamento de informações sobre a vida pessoal, as escolhas pessoais e políticas, as práticas cívicas de cidadãos, servidores públicos federais, estaduais e municipais identificados como integrantes de movimento político antifascista, professores universitários e quaisquer outros que, atuando nos limites da legalidade, exerçam seus direitos de livremente expressar-se, reunir-se e associar-se”. O ministro Gilmar Mendes também destacou que o pedido para elaboração do relatório ocorreu na gestão do ministro Sergio Moro e ressaltou que o material não condiz com a Constituição. “Conclui-se que os dossiês impugnados teriam sido produzidos não em virtude do risco ou da atuação preventiva do Seopi para evitar a ocorrência de eventuais atos criminosos ou terroristas, mas sim em virtude do exercício da liberdade de expressão, pura e simples, e de crítica das pessoas monitoradas, o que é incompatível com o regime de proteção às liberdades constitucionalmente estabelecidas”, afirmou. Único a divergir, Marco Aurélio afirmou que o documento está dentro da normalidade e não representa afronta à liberdade de expressão. Ele argumentou que Sara Giromini, conhecida como Sara Winter, apoiadora do presidente Jair Bolsonaro, também está no relatório, o que demonstra que não houve desvio de finalidade. “São nove folhas e meia a revelarem transcrição de notícias dos veículos de comunicação, e não coloco em dúvida o que aventaram os veículos de comunicação, que certamente não tiveram acesso ao cadastro do Ministério da Justiça, sobre o que poderia subjetivamente estar por trás da feitura desse cadastro a consubstanciar simples predicado, simples elemento de inteligência”, disse. Para o ministro, a ação da Rede é baseada apenas na “capacidade intuitiva” a partir do que foi publicado em jornais e revistas. Marco Aurélio afirmou que o processo não apresenta os requisitos para ser julgada procedente. Último a votar, o ministro Dias Toffoli defendeu a atuação de Mendonça e mandou indireta ao ex-ministro Sergio Moro. “Há muitas pessoas que aparecem muitas vezes na imprensa bem na foto, mas são péssimas na vida pública e nas vidas que elas têm, criando fundos para administrarem, criando inimigos políticos para depois serem candidatos e afastando pessoas da vida pública, querendo galgar depois eleições futuras. Eu já disse isso e não preciso repetir, para bom entendedor meia palavra basta”, afirmou.

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