BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro Alexandre de Moraes sugeriu nesta quinta-feira (20) que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) obrigue os partidos políticos a destinarem verba do fundo público eleitoral a candidaturas negras pelo menos no mesmo percentual que os concorrentes desta raça tiveram em cada legenda na disputa de 2016. A proposta de Moraes é que essa regra seja de transição, apenas na eleição deste ano. Ela surgiu no tribunal em meio à análise de uma consulta apresentada pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ). A parlamentar solicitou ao TSE a aplicação aos negros do mesmo entendimento no qual o STF (Supremo Tribunal Federal) obrigou os partidos a investirem ao menos 30% do fundo público eleitoral em candidaturas femininas. Até agora, três ministros do TSE já votaram. Os primeiros foram o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, e o ministro Edson Fachin. A proposta deles é determinar que os partidos destinem a verba do fundo eleitoral de maneira proporcional à quantidade de candidatos negros e brancos. Pelos votos de Barroso e Fachin, a mesma regra deverá ser aplicada à propaganda eleitoral gratuita na TV e no rádio. Terceiro a votar, o único nesta quinta-feira, Moraes disse que a regra de transição é necessária para evitar que uma eventual fixação de cota financeira para concorrentes negros não tenha um efeito contrário. Moraes acompanhou a sugestão de Barroso, mas foi além e propôs a determinação de um patamar mínimo de investimento para candidatos negros já em 2020. A ideia é que as siglas usem um montante financeiro equivalente à quantidade de concorrentes negros que tiveram no pleito municipal anterior. Segundo Moraes, a proposta de Barroso poderia levar os partidos a não inscrever nenhum negro a fim de evitar a divisão do recurso eleitoral. O ministro Og Fernandes pediu vista para analisar melhor a engenharia jurídica apresentada pelo colega. O julgamento do TSE será retomado na próxima terça (25). O julgamento começou em 30 de junho, mas foi interrompido por pedido de vista de Moraes. Nesta quinta, o ministro afirmou que concorda com a proposta de Barroso, mas então sugeriu a regra de transição. O ministro disse que a fixação de cota financeira assegura direitos fundamentais a grupos historicamente vulneráveis e não se trata de atuação substitutiva ao Congresso Nacional com a fixação de uma política de ação afirmativa genérica. O magistrado sustentou que a regra imposta pelo TSE é adequada para a integração efetiva de negros em espaços de poder. Moraes disse ainda que o cenário aponta para a perpetuação do quadro atual. Não tenho dúvidas de que a subrepresentação das pessoas negras nos poderes eleitos, ao mesmo tempo que é derivada do racismo estrutural existente no Brasil, acaba sendo um dos principais instrumentos de perpetuação da gravíssima desigualdade. Trata-se de um círculo extremamente vicioso, disse. O ministro ressaltou que os dados do TSE mostram que, em 2016, 49% dos candidatos homens eram negros, mas o grupo recebeu apenas 26% da verba eleitoral. Sem uma regra de transição, destacou o ministro, os partidos poderiam reduzir a inscrição de negros ou mesmo registrar apenas concorrentes brancos. Barroso disse ter simpatia pela ideia de Moraes e ficou de estudar a sugestão para aderir ou não à proposta. O ministro apresentou um voto extraordinário. Vou ouvir os outros colegas votar enquanto reflito sobre essa sugestão, que me pareceu extremamente importante, disse. Além de Og, ainda faltam votar os ministros Luís Felipe Salomão, Sergio Banhos e Tarcísio Vieira de Carvalho. Relator do caso, Barroso afirmou que a igualdade, tanto formal quanto material, deve ser buscada não só pelo Estado, mas por toda sociedade. Mais do que um problema individual, o racismo está inserido nas estruturas políticas, sociais e econômicas, e no funcionamento das instituições, o que permite a reprodução e perpetuação da desigualdade de oportunidades para a população negra, afirmou. Ele usou 2018 como exemplo para expor as consequências do racismo no processo eleitoral. Segundo ele, no último pleito nacional, os negros representavam 48% dos candidatos, mas foram apenas 28% dos eleitos. É necessário atuar sobre o funcionamento das normas e instituições sociais, de modo a impedir que elas reproduzam e aprofundem a desigualdade racial, disse. Barroso ressaltou ainda que a decisão do STF sobre a aplicação de percentuais mínimos de verba eleitoral em candidaturas femininas surtiu efeitos práticos em 2018. De acordo com o magistrado, enquanto em 2014 a receita média de campanhas femininas representava cerca de 28% da dos homens, na eleição seguinte esse número saltou para 62%. Logo depois, o ministro citou estudo da FGV Direito para destacar a necessidade de os colegas acompanharem sua sugestão. Embora mulheres negras representassem 12,9% das candidaturas, receberam apenas 6,7% dos recursos. Também os homens negros receberam dos partidos recursos desproporcionais em relação às candidaturas, disse, em referência a dados de 2018. Já o ministro Edson Fachin ressaltou que o grupo de trabalho do TSE coordenado por ele para desenvolver as normas eleitorais deste ano chegaram a uma conclusão parecida. O documento elaborado pelo grupo já havia afirmado a necessidade de incentivar a participação de mulheres, de jovens e de negros na política. Fachin lembrou ainda que a Constituição reconhece a igualdade de gênero e de raças como elemento essencial para uma sociedade democrática. Assim, ações em prol da igualdade racial e de gênero devem ser respeitadas e buscadas como um fim preconizado pela ordem constitucional vigente, afirmou.