RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Para um, Deus acima de todos. Para o outro, o Rio acima de tudo. Na corrida eleitoral pela Prefeitura do Rio, Marcelo Crivella (Republicanos) e Eduardo Paes (DEM) já adotam estratégias distintas para chegar ao segundo turno. Colado no presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o prefeito Crivella tenta se cacifar como o principal candidato do campo conservador. O desgaste da imagem do governador Wilson Witzel (PSC), às voltas com acusações de corrupção em seu governo e um processo de impeachment, foi recebido com alívio por aliados de Crivella. O entendimento é o de que o ex-juiz não tem força política para impulsionar um candidato. Antes, havia o temor de que uma candidatura apadrinhada por Witzel pudesse rachar o campo conservador, tirando votos de Crivella. Agora o prefeito está focado em conquistar os eleitores do presidente, cuja aprovação nacional subiu para 37%, segundo último Datafolha. O vice ideal na chapa de Crivella, de acordo com aliados, seria uma mulher indicada pelos bolsonaristas. Um dos nomes aventados é o da deputada federal Major Fabiana (PSL). A indicação, que deve passar pela avaliação da família Bolsonaro, ainda não está fechada. Após racha no PSL e tentativa de criação do Aliança pelo Brasil a tempo das eleições municipais, o senador Flávio Bolsonaro e o vereador Carlos Bolsonaro desembarcaram em março no Republicanos, sigla de Crivella. A legenda também disponibilizou sua estrutura para outros apoiadores de Bolsonaro, como uma das ex-mulheres do presidente, Rogéria Bolsonaro, que tentará voltar à Câmara Municipal do Rio. Bispo licenciado da Universal, Crivella quer mostrar aos eleitores que a união com o grupo do presidente não foi apenas por conveniência, mas estabelecida a partir de uma ideologia em comum, de valores conservadores. A campanha também irá sugerir que a proximidade e o alinhamento com Bolsonaro são importantes para socorrer o Rio em um momento de crise econômica. Enquanto Crivella já tem lado escolhido, o ex-prefeito Eduardo Paes tenta permanecer no centro, para não perder votos da direita nem da esquerda. Ele não costuma elogiar nem criticar Bolsonaro e deve fugir da nacionalização do debate. O ex-prefeito quer conquistar os votos dos bolsonaristas que desaprovam Crivella. Ao mesmo tempo, não pode se posicionar à direita porque corre o risco de no segundo turno perder a preferência da esquerda. “No Rio tem de tudo. Vou buscar todos os cariocas. Preciso para vencer da metade mais um”, afirma Paes à reportagem. “Bolsonaro era papo de 2018. O papo agora é o Rio.” Na última sexta-feira (14), o presidente Jair Bolsonaro esteve na cidade para inaugurar uma escola cívico-militar ao lado de Crivella. Foi o último dia permitido para o prefeito participar deste tipo de evento, proibido para candidatos a cargos no poder Executivo nos três meses que antecedem as eleições. Nos últimos meses, Crivella acelerou inaugurações e lançamentos de ações da prefeitura. Emails enviados à imprensa desde o início de agosto informavam sobre ao menos 10 eventos do tipo. Até mesmo a instalação de um tomógrafo em um hospital municipal foi tratada como inauguração. O presidente havia afirmado que não pretendia apoiar candidatos a prefeito, mas acenou ao bispo durante essa última cerimônia. “Algumas coincidências me ligam ao prefeito Marcelo Crivella. Somos aspirantes a oficial do mesmo ano, 1977”, disse. Em seguida, Bolsonaro e elogiou uma proposta apresentada por Crivella quando senador. O enfrentamento à pandemia do novo coronavírus teve um alto custo para o governador Wilson Witzel, mas pode ter tido reflexos positivos para Crivella. A avaliação dos que acompanham o cenário eleitoral é o de que, em geral, os prefeitos ganharam exposição e saíram fortalecidos da crise. Em dezembro de 2019, em meio a uma grave crise fiscal e na saúde, Crivella acumulava 72% de rejeição, segundo pesquisa Datafolha. Naquele mês, a prefeitura chegou a suspender todos os pagamentos e movimentações financeiras da administração. Atrasos no repasse de salários para servidores da saúde resultaram em uma greve no setor, que já enfrentava situação crítica. Sem saída, Crivella foi a Brasília passar o chapéu para angariar recursos para a prefeitura. O governo federal atendeu o pedido de socorro e liberou R$ 152 milhões para a saúde da cidade. Aliados do prefeito defendem que hoje a reprovação de Crivella é muito menor. O cientista político Ricardo Ismael, professor da PUC-Rio, avalia que o prefeito conseguiu melhorar sua imagem durante a pandemia. “Ele passou a aparecer muito, se movimentou muito na cidade. Evidente que tem desgaste acumulado, mas, de um ano e meio para cá, começou a acender o motor”, diz. O enfrentamento à pandemia será utilizado para vender Crivella como um eficiente administrador. Ao mesmo tempo, Paes será tratado como um prefeito que dedicou-se mais à Olimpíada do que ao carioca. A estratégia foi sinalizada por Crivella na inauguração da escola ao lado de Bolsonaro. Antes do discurso do prefeito, um morador surpreendeu os presentes e gritou “Crivella, você é um Judas! A praia é do povo”, em referência à iniciativa da prefeitura de demarcar lugares na praia. Em resposta, Crivella relembrou que já foi transformado em um boneco de Judas durante desfile na Sapucaí. Segundo ele, a alegoria foi uma reação por ter cortado dinheiro da festa. “Reuni o pessoal e disse: ‘Tô duro, Eduardo deixou R$ 6 bilhões para eu pagar da Olimpíada. Único dinheiro que eu posso tirar é do Carnaval’.” Em seguida, continuou a provocar o ex-prefeito: “O que é melhor para a população do Rio? O prefeito desfilar na avenida, com pandeirinho, tirar o chapéu, ser aplaudido? Ou o prefeito ser vaiado e ser chamado de Judas, mas as crianças terem alimento?”. Cientistas políticos e aliados dos candidatos avaliam que o cenário Crivella x Paes é o mais provável em um segundo turno. Isso porque, com a campanha de rua reduzida, o eleitor deve ficar com nomes conhecidos. Além disso, a crise gerada pela pandemia pode levar o carioca a buscar segurança e escolher candidatos que já administraram a cidade. Para o cientista político Ricardo Ismael, Paes é o candidato com mais chances de chegar ao segundo turno. Ele afirma que um dos motivos que causaram a derrota do ex-prefeito em 2018, quando concorreu ao governo do estado, foi a associação de sua imagem ao ex-governador Sérgio Cabral, condenado a mais de 280 anos de prisão. “Ele tentou se desvincular, mas não conseguiu. Pode ser que o eleitorado dê uma nova chance a ele, até porque os acontecimentos foram no governo do estado. Até agora não chegou nele. Paes tem um ‘recall’ forte, uma vantagem de conhecer a máquina e os problemas da cidade.” PRINCIPAIS PRÉ-CANDIDATOS À PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO Marcelo Crivella (Republicanos) Eduardo Paes (DEM) Benedita da Silva (PT) Renata Souza (PSOL) Martha Rocha (PDT) ou Bandeira de Mello (Rede) Paulo Marinho (PSDB) Clarissa Garotinho (Pros) Cristiane Brasil (PTB) Glória Heloiza ou Otoni de Paula (PSC) Rodrigo Amorim (PSL)