WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – O ex-presidente dos EUA Bill Clinton foi escalado para fazer ataques fortes e diretos a Donald Trump na convenção democrata, nesta terça-feira (18), mas seu papel foi reduzido a um discurso de cinco minutos na noite que uniu jovem e velha guarda do partido. Clinton, acostumado a falar por quase uma hora -como aconteceu na convenção de 2012-, viu grande parte do interesse dos eleitores e da imprensa americana migrar para a brevíssima aparição da deputada Alexandria Ocasio-Cortez, estrela da ala progressista, que discursou por apenas um minuto para defender o legado do progressista Bernie Sanders. Aos 78 anos, o senador por Vermont desistiu de concorrer à Casa Branca em abril e pediu, na noite de segunda-feira (17), que seus eleitores votemr em Joe Biden. Em vídeo gravado, Clinton investiu nas críticas a Trump, remetendo o republicano ao completo caos. “Em um momento como este, o Salão Oval deveria ser um centro de comando. Em vez disso, é um centro de tempestade. Existe apenas caos. Só uma coisa nunca muda, sua determinação em negar responsabilidade e transferir a culpa. A bola nunca para por aí”, disse o ex-presidente. Em seguida, insistiu na cantilena de união que tem marcado a convenção democrata. “Nosso partido está unido para oferecer a vocês uma escolha muito diferente: um presidente com atuação. Um cara pé no chão que faz o trabalho. Um homem com uma missão: assumir responsabilidades, não transferir a culpa; concentrar, não distrair; unir, não dividir. Nossa escolha é Joe Biden.” Desde sua abertura, na segunda-feira (17), a convenção que vai oficializar Biden candidato à Casa Branca com Kamala Harris como vice tenta mostrar que o arco de apoio em torno da chapa moderada é bastante amplo, abarcando desde os mais progressistas, que foram às ruas contra o racismo e a violência policial, até os republicanos cansados dos arroubos do atual presidente. O evento acontece pela primeira vez de maneira virtual, em razão da pandemia, e os discursos têm sido reduzidos, ocupando duas e não as quatro horas que eram habituais quando a convenção acontecia de maneira presencial. Mesmo assim, os principais oradores têm falado de 10 a 20 minutos, e em horário nobre, após às 22h (23h em Brasília), o que não foi o caso de Bill Clinton, que falou antes de Ocasio-Cortez. O ex-presidente representa os democratas mais moderados, assim como Biden, mas desde 2016, Bernie Sanders tem travado uma batalha -cada vez mais ampla e fortalecida- que busca levar o partido à esquerda e mobilizado militantes. AOC, por sua vez, é a deputada mais jovem a ser eleita à Câmara dos EUA e representa uma encruzilhada ao futuro do establishment democrata. Nos próximos anos, independentemente do resultado das eleições, a cúpula da sigla precisará decidir como se posicionar diante da base eleitoral mais progressista. O presidente tem sido tachado pelos democratas como incapaz de governar, enquanto Biden seria a pessoa ideal para liderar o país e tirá-lo da crise. Clinton disse que mais quatro anos de Trump serão de “culpar e menosprezar crises”, como o republicano fez com a pandemia que já matou mais de 170 mil pessoas nos EUA. Ao lado do ex-presidente e de Ocasio-Cortez, um dos discursos mais esperados da noite era o da esposa de Joe Biden, Jill. Sua fala se concentrou na trajetória pessoal de seu marido, muitas vezes citada na campanha: semanas após ter sido eleito senador por Delaware pela primeira vez, em 1972, o democrata perdeu sua primeira esposa, Neilia, e uma filha, Naomi, de apenas um ano de idade, em um acidente de carro. Em 2015, Biden perderia outro filho, Beau Biden, vítima de um câncer no cérebro. Doutora em ciências da educação, Jill falou de uma sala de aula do colégio Brandywine, em Wilmington (no estado de Delaware), onde lecionou no início de sua carreira, e se dirigiu em tom afetivo às famílias que enfrentam a incerteza da volta às aulas durante a pandemia. “Dá para ouvir a ansiedade que ecoa pelos corredores vazios. Não há o cheiro de cadernos novos ou de pisos recém-encerados. As salas de aula estão escuras e os rostos jovens e brilhantes que deveriam ocupá-las estão confinados a caixas na tela do computador”, disse. Ao lado de Clinton, outras figuras do establishment democrata foram escaladas para falar nesta terça, como o também ex-presidente Jimmy Carter, o líder do partido no Senado, Chuck Schumer, e o ex-secretário de Estado John Kerry. O esforço para mostrar a amplitude do arco em apoio a Biden, porém, que envolve inclusive republicanos com participação na convenção, tem incomodado eleitores mais jovens e progressistas, que não se mobilizaram para votar em Hillary Clinton em 2016, e que agora Biden precisa reconquistar.