SANTOS, SP (FOLHAPRESS) – Nos últimos 28 anos, os frequentadores da Igreja Jardim de Oração, em Santos (SP), acostumaram-se a ouvir seu pastor-titular, Milton Ribeiro, 62, em cultos, reuniões e conversas de aconselhamento. Desde o início da pandemia, a presença de Ribeiro na sede da igreja, numa pequena rua a duas quadras da praia do Gonzaga, foi interrompida. O distanciamento físico aumentou em 16 de julho, quando ele foi empossado ministro da Educação pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Logo depois, pegou Covid-19, da qual já se recuperou. No domingo (9), o reverendo Milton, como é chamado pelos fiéis, enviou um vídeo aos participantes de um culto no salão principal da igreja, onde as atividades com público foram retomadas no início do mês mediante rígido protocolo de segurança. Queria agradecer às preces pela sua saúde. “Logo, logo isso vai passar, para que a gente possa retomar o trabalho normal. Quero agradecer a Deus e às orações que os irmãos fizeram. Eu senti que estava de fato sendo sustentado pela minha igreja”, afirmou em mensagem exibida em um telão. Ribeiro é a principal referência da igreja presbiteriana fundada em 1969, cujo público é majoritariamente da classe média da cidade litorânea e adjacentes. Seus cerca de 900 membros o reelegem pastor-titular a cada cinco anos desde 1992. “Que ovelha quer ser pastoreada por alguém em quem não confia?”, justifica o reverendo Luiz Lacerda, 31, um dos auxiliares de Ribeiro. Mesmo tendo assumido uma das pastas mais complexas da máquina federal, e com a tarefa de recuperar sua credibilidade após as criticadas gestões de Ricardo Vélez e Abraham Weintraub, Ribeiro não descuidou de seu rebanho. Não se afastou do posto de pastor-titular e continua dando orientações à distância ao conselho da igreja e aos seis pastores-auxiliares em reuniões pelos aplicativos Zoom e WhatsApp. “Ele é quem dá a visão de como se deve caminhar, e nós o auxiliamos. Temos uma coesão de pensamento muito grande”, diz Lacerda. Essa situação é facilitada pelas próprias características da fé presbiteriana, cujas igrejas se organizam de forma coletiva, por meio de conselhos. Parte do chamado ramo histórico do protestantismo, o presbiterianismo conta com cerca de 1,5 milhão de adeptos no Brasil. O porte mediano da igreja também contribui para sua coesão. No domingo, fiéis que chegavam para o culto noturno, às 19h, cumprimentavam-se com intimidade na entrada da igreja, enquanto esperavam para terem sua temperatura medida e desinfetarem as mãos com álcool em gel. Autorizada pela prefeitura de Santos a reabrir no início de agosto, a igreja limitou a 50 pessoas a presença no seu salão, onde normalmente cabem 250. São 37 fiéis e o restante pastores e os oito membros de uma banda, em dois cultos dominicais. Todos têm de se inscrever previamente por um aplicativo ou pelo site. Os bancos de couro foram bloqueados com fitas vermelhas em diversos pontos, e o recolhimento do dízimo agora é feito apenas por transferência bancária. O uso de máscaras é obrigatório. No culto de 1h30, transmitido on-line para quem não pôde estar presente, Lacerda concentrou-se em temas litúrgicos. Escolheu como assunto principal uma passagem do Evangelho de São Marcos, em que Jesus perdoa os pecados de um paralítico e é recriminado pelos escribas em Cafarnaum, na Galileia. Só quando cura o enfermo, que sai andando, a multidão se convence de que está diante do filho de Deus. A única referência direta a temas da atualidade foi quando agradeceu a Deus por ter preservado a vida de Ribeiro e pediu orações para os doentes pela Covid. Também fez prece pelos governantes que têm a responsabilidade de tomar medidas contra a doença, mas sem mencionar especificamente o presidente Jair Bolsonaro ou outras autoridades. “Oramos pelo Brasil muito antes de o reverendo Milton ser ministro. Uma das nossas funções como igreja é orar pelos nossos governantes”, disse o pastor em entrevista após o culto. No dia anterior, o Brasil havia atingido a marca de 100 mil mortos. Para Lacerda, a morte é uma questão teológica, não política ou cultural. “É triste termos um número tão alto. Mas num país continental como o Brasil, seria difícil [evitar], mesmo com todos os cuidados”, afirmou. Questionado, ele não quis fazer comentários sobre o governo Bolsonaro. Disse apenas que a escolha de Ribeiro para o MEC não chegou a ser uma surpresa total para a igreja, porque ele já havia sido citado como uma possibilidade anteriormente. A atuação no ministério será laica, aposta o pastor, o que não significa que será isenta de seus princípios como religioso. “O Estado ser laico não significa que a gente deixa de ter princípios. Não é um Estado ateu. A ideia da laicidade é que todos tenham a liberdade para expressar o que creem.” A Igreja Jardim de Oração se define como “ortodoxa”, seguidora à risca da Confissão de Fé de Westminster, encontro ocorrido no século 17 na Inglaterra que definiu os princípios adotados pelas igrejas presbiterianas. “Nós entendemos que o significado da Bíblia não muda. Não há necessidade da fazer uma releitura”, afirmou o pastor. Mas ser ortodoxo não significa necessariamente ser conservador, disse. “Tem a ver com doutrina, não com conservadorismo político. Defendemos o que a Bíblia defende”. Nas principais questões comportamentais, a igreja se alinha à opinião predominante no meio evangélico, definindo-se como pró-vida e pró-família. E há simpatia dos membros por Bolsonaro? “Talvez sim, mas nunca é unânime”, afirma Lacerda. Frequentadora assídua da igreja, a estudante Thais Oliveira de Souza, 17, estava no culto com a irmã. Ela conhece o novo ministro desde pequena. “Tenho foto dele me carregando quando eu era bebê”, disse. Souza disse esperar que no governo Ribeiro tenha a mesma conduta que sempre demonstrou como uma espécie de pai da comunidade da igreja. “Meu desejo é só que ele seja justo com todos e que tenha sabedoria. E que sua administração seja laica, óbvio”.