BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) – A União Europeia anunciou nesta sexta (14) que não reconhece o resultado da eleição presidencial na Belarus e vai estudar sanções contra o país, anunciou em rede social o alto representante para Relações Internacionais do bloco, Josep Borrell. A comissão eleitoral bielorrussa divulgou nesta sexta o resultado final do pleito, que dá ao atual líder autocrata, Aleksander Lukachenko, 80% dos votos, número contestado por líderes internacionais, oposição e milhares de pessoas que têm protestado desde o dia 9, data da votação. Reprimidas com muita violência no início, as manifestações não recuaram. No sexto dia de atos, garotas de branco e flores nas mãos eram, outra vez, a face mais visível deles. Quando a multidão convergiu para o prédio do Parlamento, em Minsk, pelo menos dois agentes de segurança baixaram seus escudos, fazendo com que as mulheres corressem para abraçá-los. Mas a peça-chave desta sexta-feira foram os operários das grandes indústrias estatais. Lukachenko, no poder há 26 anos, até tentou segurar o apoio dos trabalhadores, considerados espinha dorsal de seu apoio político –ele se apresenta como representante do “bielorrusso comum” e atribui qualquer manifestação de oposição a “desocupados de passado criminoso”. Nesta sexta, porém, ele viu o terceiro dia de protestos em fábricas contra a repressão que já deixou ao menos dois mortos, centenas de feridos, milhares de presos e desaparecidos e um número crescente de denúncias de tortura. “Agradeço aos colaboradores da BMZ [aço], da MAZ [montadora], do THP [parque tecnológico] e das demais equipes que aderiram [aos atos]”, disse a principal candidata da oposição, Svetlana Tikhanovskaia, em vídeo gravado na Lituânia, para onde foi por questões de segurança, segundo sua campanha. Entre as demais equipes estão as de megaempresas. A maioria das companhias havia mantido os trabalhos na quinta, mas, nesta sexta, crescem anúncios de greves e paralisações por algumas horas. “Próxima estação: novo presidente”, dizia o slogan dos metroviários. Lukachenko apontou que as greves põem em risco os próprios operários. “Salvando a empresa, você alimentará sua família”, afirmou. “Pelo amor de Deus. Hoje você não vai produzir dez tratores, não vai colocá-los no mercado, amanhã os alemães virão com os americanos, os russos vão trazer seus equipamentos.” Ameaças, porém, não demoveram boa parte dos operários, que fizeram marchas pela cidade ao final do expediente –quando não tinham parado o trabalho antes disso. “Por quanto tempo você vai olhar como nossos filhos são espancados? O ponto sem volta foi ultrapassado”, afirmaram trabalhadores da fabricante de maquinário pesado Belaz que se encontraram com o prefeito de Zhodino, segundo sites bielorrussos. Em seu vídeo, Tikhanovskaia pediu o fim da violência e convocou novos atos. “Peço a todos os prefeitos que ajam como organizadores de reuniões de massa pacíficas em 15 e 16 de agosto”, disse. O chão de fábrica não é o único espaço em que Lukachenko aparenta ter perdido terreno nos últimos dias. Auxiliares de seu governo, âncoras de TVs estatais, empresários de TI e ex-militares e policiais –alguns deles presos por se recusarem a reprimir manifestações pacíficas– deixaram seus cargos. Na noite de quinta, sob pressão, o governo anunciou a liberação de cerca de 1.000 dos 7.000 presos desde domingo, e houve menos relatos de violência nos atos noturnos. Políticos também adotaram discurso conciliador. “Assumo a responsabilidade e me desculpo pelos ferimentos causados às pessoas”, disse o ministro do Interior, Yuri Karayev. Apesar do aparente recuo, a Anistia Internacional, a Organização Mundial contra a Tortura e entidades de direitos humanos começaram a recolher provas para denunciar Lukachenko ao Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade. Ao anunciar que não reconhece o resultado do pleito, a UE citou que deve sancionar os responsáveis por “falsificação e violência” na Belarus. As punições, porém, terão pouco efeito prático, avalia Sergej Sumlenny, chefe do escritório de questões bielorrussas da Fundação Heinrich Boell. Ele diz que a cúpula do governo da Belarus não tem, até onde se conhece, propriedades na UE. “E Lukachenko já proíbe seus auxiliares de viajarem para o Ocidente.” Sumlenny diz que o autocrata está acostumado a viver sob sanções –que vigoraram até 2016– “e pode até se aproveitar delas como prova de que é poderoso o suficiente para incomodar a UE e reclamar de discriminação”. Hoje a UE já proíbe a venda de armas para a Belarus, mas o governo encontra brechas para comprar munições da República Tcheca e da Polônia. A oposição –e alguns líderes estrangeiros– defendem a recontagem dos votos, já que, segundo a candidata, “onde as comissões contavam os votos honestamente, o apoio variou de 60% a 90%”. O tom menos agressivo dos atos não impede que Lukachenko continue perdendo poder, afirma Kamil Klysinski, especialista em questões bielorrussas do Centro de Estudos Orientais, em Varsóvia. Segundo ele, já são vistas “as primeiras sérias divisões dentro da elite, incluindo estruturas de aplicação da lei”. É uma incógnita também o que fará a Rússia, que vê na Belarus um país satélite sobre o qual não quer perder o controle. Nesta sexta, autoridades russas anunciaram o retorno de 32 mercenários presos no final de julho, acusados de buscar a desestabilização do país antes das eleições.