BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Em 20 meses de governo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi o chefe do Executivo que mais sofreu reveses na apreciação de vetos pelo Congresso desde 2000. O levantamento feito pelo jornal Folha de S.Paulo considera o histórico de dados disponíveis no site do Congresso Nacional. Desde o ano passado, Bolsonaro vetou 100 projetos de lei, total ou parcialmente. Deputados e senadores reverteram canetadas do presidente a 24 propostas. Até agora, o presidente teve 10 vetos totais rejeitados. Além disso, o Congresso derrubou vetos de 14 projetos que tinham sido parcialmente barrados por Bolsonaro. Antes, o maior número de vetos derrubados pelos congressistas pertencia a Michel Temer (MDB), que governou o país por quase 31 meses. Nesse período, o Congresso rejeitou 4 vetos totais e retomou dispositivos vetados pelo presidente em 17 propostas. Nos 20 meses de governo até este momento, Bolsonaro já vetou totalmente 30 textos avalizados pelo Legislativo -4 desses vetos integrais ainda estão em tramitação. Dentre os que já foram apreciados em sessão no Congresso, os congressistas acataram algumas decisões, como a canetada integral ao projeto que regulamentava a profissão de cuidador, ao que criava o cadastro nacional da pessoa idosa e ao que dispunha sobre a interceptação de correspondência de presos. Por outro lado, deputados e senadores derrubaram vetos totais de Bolsonaro que tinham o intuito de atender a equipe econômica -caso do projeto que prorrogava o regime especial de tributação para construtoras do Minha Casa Minha Vida- ou sua base conservadora, como na decisão de barrar a proposta que previa a notificação compulsória dos casos de suspeita de violência contra a mulher. Nos 17 projetos parcialmente vetados e que sofreram reveses no Congresso, Temer barrou um total de 366 dispositivos. Desses, 282 foram retomados, que manteviram 84 dispositivos vetados. No caso de Bolsonaro e considerando somente os vetos com tramitação encerrada, o Legislativo manteve a decisão do presidente em 297 dispositivos, de um total de 373 -os vetos aos demais 76 dispositivos foram derrubados pelos deputados e senadores. A derrubada ou manutenção do veto espelha o relacionamento que o governo tem com o Congresso. Desde que foi eleito, Bolsonaro adotou uma postura pouco conciliatória com representantes do Legislativo, frequentemente afirmando que vetaria leis que ainda nem tiveram a tramitação concluída pelos congressistas -é o caso do projeto das fake news, aprovado no Senado e ainda em análise na Câmara. O presidente também não se preocupou em construir uma base sólida no Congresso. Eleito pelo PSL, viu o partido rachar em outubro do ano passado durante uma disputa com o presidente da sigla, o deputado Luciano Bivar (PE). Depois disso, metade dos parlamentares do PSL adotou uma postura mais independente em relação ao governo. No começo deste ano e para tentar ampliar seu apoio na Câmara e reduzir a influência do presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), Bolsonaro se aproximou de partidos do chamado centrão -como PP, PL e Republicanos-, negociando cargos em troca de votos. Isso se traduziu em uma troca na articulação política na Câmara concretizada nesta quarta-feira (12). O então líder do governo na Casa, Major Vitor Hugo (PSL-GO), foi substituído no cargo pelo deputado Ricardo Barros (PP-PR), em um aceno ao líder do PP na Casa, Arthur Lira (AL), que comanda a base informal do Executivo entre os deputados. No entanto, foram poucas as vitórias do governo desde que essa aproximação começou, nos últimos meses. Recentemente, o Planalto escapou de uma derrota expressiva na Câmara durante a votação do Fundeb, fundo que financia a educação básica. Além do apoio incerto, Bolsonaro irritou congressistas ao descumprir acordos fechados entre líderes do governo na Câmara e no Senado para aprovar projetos em tramitação nas Casas. Os exemplos mais recentes foram os vetos do presidente ao marco legal do saneamento e à prorrogação da desoneração da folha de pagamentos. As duas negociações haviam sido costuradas no Congresso com o aval do governo e foram posteriormente vetadas por Bolsonaro, desagradando os parlamentares. No Legislativo, é quase certo que os vetos parciais serão derrubados, ampliando ainda mais o número de reveses sofridos pelo presidente. Na falta de uma base de sustentação e para evitar uma derrota política expressiva, Bolsonaro tem contado com o apoio do presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), que vinha segurando as votações de vetos, travando a apreciação de outras matérias pelos parlamentares. Alcolumbre busca apoio no STF (Supremo Tribunal Federal) para se reeleger na Presidência do Senado. Bolsonaro também aposta em uma eventual eleição de Lira na Presidência da Câmara, o que poderia melhorar o ambiente para votação de propostas do governo na Casa. Além de Bolsonaro, Temer e Dilma Rousseff (PT) enfrentaram resistência do Congresso a seus vetos, resultado também da perda de capital político. O primeiro, ao longo de sua gestão, teve duas denúncias barradas pela Câmara. Já a petista sofreu um impeachment em 2016. A força do governante e a relação com os presidentes da Câmara e do Senado sempre se refletiram no número de vetos que iam ou não a voto em sessão conjunta do Congresso. Os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma tiveram vários vetos não apreciados pelos congressistas, fazendo vista grossa a regras de trancamento de pauta. Isso mudou em 2013, quando o STF decidiu que vetos não apreciados trancavam pauta e deveriam ser apreciados em ordem cronológica. A decisão materializou uma resolução promulgada pelo Congresso em julho daquele ano, que estabeleceu o rito para a apreciação de vetos pelos congressistas.