BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) – A principal candidata da oposição bielorrussa, Svetlana Tikhanovskaia, deixou a Belarus na madrugada desta terça-feira (11), enquanto protestos contra o resultado das eleições entraram em seu terceiro dia em várias cidades do país. Os manifestantes, que foram reprimidos com violência crescente no domingo e na segunda, não aceitam o resultado oficial da eleição presidencial, que deu ao atual líder autocrata, Alexandr Lukachenko, 82% dos votos. O número é considerado questionável por analistas políticos e pelos oposicionaistas, e a União Europeia divulgou comunicado em nome de seus 27 membros afirmando que a eleição na Belarus não foi livre nem justa. Na noite de terça, vídeos em redes sociais mostravam novas prisões e violência contra de manifestantes, jornalistas e até menores de idade. Em cidades do interior, pessoas eram retiradas de seus carros e espancadas pela polícia. Uma equipe de filmagem da BBC em Minsk foi atacada pelas forças de segurança. Cercados por homens de uniforme preto sem insígnia, os três jornalistas, que usavam coletes de identificação, mostraram as acreditações emitidas pelo Ministério das Relações Exteriores. Um dos policiais arrancou o cartão de identificação do pescoço do correspondente, arrancou a câmera de suas mãos e tentou quebrá-la. Quando os outros dois tentaram convencer o agente a devolver o cartão de credenciamento, policiais passaram a espancá-los e a bater na câmera, relata a emissora britânica em seu site russo. Segundo correspondentes internacionais, a internet foi cortada pela segunda noite consecutiva. De fora do país, veículos como o russo Meduza mantêm a cobertura online sobre a repressão. Durante a campanha eleitoral, candidatos foram presos ou impedidos de concorrer, membros da oposição e jornalistas foram detidos várias vezes e o governo impediu a observação por parte de grupos internacionais. Tikhanovskaia, 37, uma dona de casa e mãe de dois filhos que assumiu a candidatura após a prisão de seu marido, o blogueiro Siarhei Tikhanovski, contou em entrevista à Folha de S.Paulo, publicada na sexta, que foi ameaçada em ligação anônima e precisou mandar os filhos para o exterior. Ela disse que só aceitou se separar das crianças para não abandonar a campanha e trair a confiança dos apoiadores, que chegaram a lotar comícios com mais de 50 mil pessoas. Na manhã de segunda, a candidata havia afirmado em entrevista coletiva que a eleição foi extensamente fraudada e registrou uma queixa na Comissão Eleitoral da Belarus, depois do que teria ficado detida pelo regime de Lukachenko durante ao menos sete horas. Em vídeo divulgado nesta terça e reproduzido em canais governistas da Belarus, de olhos baixos e voz abatida, ela leu uma declaração pedindo aos bielorrussos que não saiam às ruas e cumpram as leis. Na Lituânia, onde chegou na manhã desta terça, ela gravou um segundo vídeo afirmando que a campanha a atingiu como um tiro: “Pensei que poderia sobreviver a tudo, mas provavelmente ainda sou a mesma mulher fraca que era antes de assumi-la. Deus livre qualquer um de vocês de ser forçado a fazer a escolha que tive que fazer. Nenhuma vida vale o que está acontecendo agora. As crianças são a coisa mais importante em nossas vidas, afirmou ela. A reação desproporcionalmente violenta do governo bielorrusso, que deixou ao menos um morto na última noite e centenas de feridos, presos e desaparecidos, foi condenada por vários governos europeus. A União Europeia afirmou que “as eleições não foram livres nem justas”. “As autoridades aplicaram violência desproporcional e inaceitável. Milhares de pessoas foram detidas e a repressão às liberdades de reunião, mídia e expressão se intensificou”, diz o comunicado. Segundo a UE, as relações com o país do Leste Europeu vinham melhorando desde a liberação de presos políticos, em 2015, mas “sem progressos em direitos humanos e Estado de direito, só podem piorar”. O bloco arfirma que pode “tomar medidas contra os responsáveis pela violência observada, prisões injustificadas e falsificação de resultados eleitorais”. Assim como nas duas primeiras noites de repressão aos protestos, os policiais usaram balas de borracha, gás lacrimogêneo, granadas de dissuasão e rajadas de água. Depois de terem sido cercados pelas forças de Lukachenko no domingo à noite, os manifestantes adotaram uma tática diferente na segunda e na terça: centenas de grupos fazem protestos em várias partes de Minsk, se dispersando à chegada da polícia e se reagrupando depois. Na manhã desta terça, vídeos mostram trabalhadores deixando fábricas e empresas para se manifestar contra os resultados das eleições bielorrussas. As eleições deixaram claro que Lukachenko finalmente perdeu o apoio da maioria da população, afirmou o especialista em questões bielorrussas Kamil Klysinski, em entrevista à Folha de S.Paulo. “Estou convencido de que a maioria não o apoia mais e que isso é irreversível, ele não conseguirá recuperar a confiança da maioria dos bielorrussos.” O chanceler da Lituánia, Linas Linkevicius, afirmou que a chefe de campanha da oposição bielorrussa, Maria Moroz, também está em seu país. Ela havia sido detida pelo governo da Belarus no sábado. Segundo o jornal britânico Guardian, a saída de Tikhanovskaia do país foi uma condição para a liberação de Moroz. Membros da oposição afirmam que outras pessoas da equipe continuam presas, mantidas como reféns.